quarta-feira, 22 de junho de 2011

JESSE E LUTZ


          Em setembro de 1913, quando Adolf Hitler completava seu quarto mês de estadia em Munique, nascia em Oakville, pequena cidade norte-americana, James Cleveland Owens, ou “Jesse” Owens; um neto de escravos que se tornaria um dos maiores atletas de todos os tempos. Vinte e três anos depois deste dia,  nos jogos olímpicos de 1936, os dois personagens cruzariam seus caminhos no Estádio Olímpico de Berlim e perpetuariam um momento marcante da nossa história.
A corrida dos cem metros rasos – a qual Owens participara e vencera e Hitler presenciara – ficara marcada como uma prova lendária e não raras vezes volta à tona com diferentes versões sobre o ocorrido. A comumente aceita é a de que Hitler, que supostamente utilizara os jogos olímpicos como uma propaganda da superioridade da raça ariana, não suportara ver um negro receber uma medalha de ouro em pleno Estádio Olímpico de Berlim. Segundo esta corrente, Adolf Hitler teria se negado a descer da tribuna de honra para entregar a medalha a Jesse, indo embora ao término da prova, quebrando um protocolo que era seguido sempre que estava presente no estádio. Outra corrente (parte desta, inclusive, nega a existência do holocausto) acredita na hipótese deste fato não ter ocorrido e defende uma versão menos mitificada do fato. Para estes, Hitler já não adotava o protocolo desde antes da vitória de Owens, seguindo orientação do presidente do Comitê Olímpico Internacional, o Conde Henri de Baillet-Latour, da Bélgica.


O fato, antes de qualquer versão histórica dos jogos, foi a amizade que nascera entre o afroamericano Jesse Owens e o alemão Lutz Long; dois adversários na pista, com uma cumplicidade evidente fora dela. Long não ficou conhecido somente pela medalha de prata conseguida com o salto triplo, mas também pelo comportamento perante o concorrente Jesse Owens. Após sua vitória do dia anterior nos 100 metros, Owens obteve duas tentativas queimadas no treino de qualificação para o salto triplo e só lhe restava mais uma tentativa. Long passou algumas dicas e ele ultrapassou a distância mínima de 7,15m e se qualificou para a final... Na final Long ficou com a marca de 7,87m, atrás dos 8,06m de Jesse Owens”. [1]

Owens voltou aos Estados Unidos da América do Norte com quatro medalhas de ouro. Durante muitos anos os dois amigos se corresponderam e depois da Segunda Guerra Mundial, após a morte de Long (que recebeu, postumamente, a Medalha Pierre Coubertin, que é entregue por atos especiais de desportismo), Owens retornou várias vezes à Alemanha para visitar o túmulo do amigo.
Jesse Owens morreu aos 66 anos de idade, vitima de câncer no pulmão; em sua biografia deixou uma ferida latente da sua memória: “Quando voltei para minha terra natal eu não podia entrar no ônibus pela porta da frente e também não podia morar no lugar que eu queria. Eu não fui convidado a apertar as mãos de Hitler, mas também não fui à Casa Branca para apertar as mãos do presidente do meu país”. Um paradoxo interessante: Jesse Owens parece ter sido o primeiro “clássico” herói norte-americano; o qual tem de lutar, inclusive, contra seus próprios defendidos.
Em 2009, no penúltimo dia de competições do Campeonato Mundial de Atletismo ocorreu um momento especial. Setenta e três anos depois de seus avôs protagonizarem um dos episódios mais marcantes da história olímpica, as netas de Jesse Owens e de Luz Long se reuniram no mesmo palco, o Estádio Olímpico de Berlim, para assistir à final masculina do salto em distância e entregar as medalhas aos dois primeiros colocados.



Fontes e Imagens:
 Blackthink: my life as black man and white man, Pocket Books, 1971;
www.jesseowens.com;
www.olympic.org;
[1] Wikipédia (edição e versão alemã);
Imagem 01: Poster dos jogos olímpicos de 1936 (Berlim 1936 collection - COI);
Imagem 02: Foto de Jesse Owens ao lado de Lutz Long (Berlim 1936 collection - COI);
Imagem 03: Entrega das medalhas, do salto em distância, do Campeonato Mundial de Atletismo de 2009 (www.zimbio.com).



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